Levanto-me, forço a vista por
entre o embaçado do vidro na janela, é que agora eu me pego olhando longe, como
que por convidativa me houvesse uma esperança remanescendo a cada relance, a
cada gota dessa chuva arranhando o vidro do coração. É, não há de ser hoje que amor
virá fazer breve a sua visita. Sento no chão gelado, então vou impelindo da
memória aquele aceno que fingiu ser até logo, ainda penso em uma despedida
decente, que acoa, ecoa e logo fica turva. Acendo, fumaça, não relaxa, por que
é tão insuportável? Incomoda esse barulhinho sopitado de alma quebrada, contido,
devagar, infindável tanto quanto a profundidade das mágoas enterradas pelas
águas. O acertar, nem soa acerto ao certo. Dores rasas, num vau, sem aval, nem
decreto de felicidade se faz lei. Falta calor pra pôr cerrado entre os dedos.
Vago pela casa, achando e escondendo
os passos que o acaso me tirou ao caminho certo, e vai retrocedendo, tudo ao
vislumbre de um feixe de luz por entre as persianas. Ainda é dia... Mas o sol
se escondeu por detrás da nuvem, são seus olhos que não param de chover, são
lágrimas, são nunca mais. Tem uma porta, tem a maçaneta, posso abrí-la a qualquer
instante, embora esteja presa, de porta fechada, mas não trancada, de alma
solta, mas enjaulada entre as paredes da minha vontade de ser livre, mas não
posso... Tenho que permanecer, sair tem o risco de esbarrar com decepções, mas
são elas que provam que tentei, que tentei não me esconder, que amei. Mas como
horas se passam nubladas, não tem hora para mudar e sair, pra viver, só que por
um pouco, e não sentir, sem querer, o que resta pra amar, nem que por um dia
mal vivido.
Matheus Souza